NO INÍCIO DO SÉCULO XX O CICLISMO, ENFIM, ERA DESBANCADO PELO "FOOT-BALL" NO AMAZONAS.
No final do século XIX as práticas esportivas no Amazonas começavam a se intensificar, sendo seus praticantes na maioria pertencentes à elite local. A primeira agremiação esportiva do Estado foi o Sport Club Amazonense, fundado em 1897. Mas entre as novas práticas esportivas daquele período, a que caiu no gosto e simpatia de todos em Manaus foi o ciclismo. Com a aceitação positiva da sociedade amazonense pelo esporte das pedaladas, um grupo de jovens entusiastas fundaram, em 1898, a primeira agremiação do Estado destinada somente ao ciclismo: o Grupo Cyclista Amazonense.
Os sócios do clube faziam suas disputas em suas bicicletas na Praça General Osório, que foi batizada por eles de VELÓDROMO NACIONAL. Nas disputas, geralmente aos domingos, grande massa de espectadores se dirigia à Praça para torcer por seus ciclistas preferidos, entre eles Alfredo Bezerra, Albano Nobre, Adolpho Vasconcellos e Bacamarte (José Pinto). Porém, com o tempo, o Velódromo da Praça General Osório foi desativado devido o local não ser adequado para o ciclismo.
Sem um Velódromo, temporariamente os ciclistas de Manaus se limitaram a fazer seus passeios e disputas em outros locais, como na Praça de São Sebastião. Mas os ciclistas manauaras começaram a procurar outro local que pudesse servir de um novo Velódromo e, enfim, encontraram esse espaço na antiga Praça Visconde do Rio Branco. Coube então ao coronel José Maranhão adequar a Praça para um Velódromo, além de ser ele o principal membro de uma empresa que organizava os campeonatos ciclistas na capital do Amazonas, a "MANÁOS SPORT".
A FASE DE OURO DO CICLISMO AMAZONENSE: 1905 -1907
A inauguração do Velódromo, que foi batizado de "Amazonense" ou "Manáos Sport", aconteceu no dia 30 de julho de 1905, com grande presença de público, autoridades e com os melhores ciclistas do Amazonas no momento: Stoessel, Matosinhos, Cyclo, Liberal, Patagônia, Amazonas, Espalhado e Hamburgo.
STOESSEL (que era o pseudônimo de Deodoro Freire) e PATAGÔNIA
(pseudônimo do português Manoel de Oliveira Pinho) eram os principais rivais e
campeões do ciclismo amazonense, eles tinham grande prestígio no meio social e
esportivo de Manaus, e também tinham muitos fãs que lotavam as dependências do
Velódromo que, após o fim da corrida, invadiam a pista e carregavam nos braços
o ciclista campeão da tarde.
Era o auge do ciclismo em Manaus, a cidade praticamente respirava o esporte das pedaladas. Em dias de disputas bondes partiam lotados rumo ao Velódromo "Manáos Sport". Nas arquibancadas do Velódromo o público, em êxtase durante as corridas, gritava "entra Stoessel", "arranca Patagônia" ou "embala Liberal", incentivando seus ciclistas preferidos. Por onde quer que as pessoas transitassem pela cidade, era logo surpreendido pelas buzinas de uma bicicleta, que eram na verdade conduzidas por Cyclo, Matosinhos ou Hamburgo que pediam passagem pois estavam treinando resistência pelas ruas de Manaus.
Em todas as rodas de conversa, o assunto esportivo predileto era sobre o ciclismo onde se comentava sobre o último treino de Stoessel, a derrapagem de Matosinhos, o tempo de uma volta feita por Cyclo ou a resistência de Patagônia e Espalhado. Também comentavam que, se Cyclo se dedicasse nos treinos dentro de um ano venceria Stoessel, já outros afirmavam que Stoessel era invencível e somente algum esportista de fora podia derrotá-lo. Para abrilhantar ainda mais a boa fase do ciclismo local, chegava à Manaus, contratado pelos dirigentes do Velódromo e da "Manáos Sport" o renomado ciclista italiano EMÍLIO CORDA que mediu forças com o ciclista amazonense Stoessel, numa tarde festiva, com a vitória sorrindo para o lado de Stoessel.
Veio depois, em dezembro de 1906, disputar contra o próprio Stoessel, o
ciclista paraense ALCEBÍADES ALVES (campeão do Pará). O páreo, que parou a
cidade sendo a grande sensação esportiva daquele ano, intitulado "campeões
da Amazônia", aconteceu em 25 de dezembro e terminou com a vitória do
ciclista manauara.
EXTINÇÃO DO VELÓDROMO E DECLÍNIO DO CICLISMO NO AMAZONAS
Porém quando o ciclismo atravessava sua melhor fase no Amazonas, eis que em 1907 a intendência (prefeitura)de Manaus resolve extinguir o Velódromo, o que causou revolta entre os praticantes e torcedores. A desculpa das autoridades é que pretendiam transformar o local em um parque artístico ou campo de futebol.
Um renomado fã da modalidade protestou e escreveu dizendo que o ciclismo era o exercício físico mais bem perfeitamente organizado entre os esportistas de Manaus e o que mais se adaptava à simpatia da população, estando a modalidade consolidada e progredindo no Estado. Ele também afirmava que os triunfos de Stoessel, o maior ciclista do Amazonas, repercutiram até em países estrangeiros. E concluía relatando que meses antes já haviam tentado converter o Velódromo em um local para os praticantes do remo fazer seus exercícios físicos.
O entusiasta, revoltado, também lembrava que não havia necessidade de transformar o Velódromo em um campo do esporte bretão, pois o futebol em Manaus pouco tinha evoluído, dizendo que jamais tinham se organizado mais de dois clubes de futebol na cidade e que, nos seus jogos, nunca esses times se apresentavam completos. Ele então não poupou críticas aos atletas do jogo inglês e das regatas e finalizava seu protesto dizendo que só restava agora acompanhar as disputas do turfe, que também era criticado por ele pois afirmava que a modalidade servia unicamente ao comércio que o explorava.
O certo é que após a desativação da pista de ciclismo e o fim das disputas na Praça Rio Branco, o local não virou nada do que estava proposto pois continuou tendo sua função de logradouro público. Com a extinção do Velódromo, o ciclismo praticamente morreu temporariamente em Manaus, não se tendo mais disputas em nem instituições que o organizassem.
FUTEBOL OCUPA O LUGAR DO CICLISMO E CAI NA SIMPATIA DA POPULAÇÃO
Porém no vácuo deixado pelo ciclismo começava, timidamente, a ganhar espaço uma outra modalidade ainda obscura para os manauaras: o "foot-ball".
Introduzido em Manaus pelos ingleses, que já o praticavam na cidade desde 1903, o futebol aos poucos foi caindo na simpatia dos órfãos do ciclismo e demais pessoas. Ainda estando o esporte com os pés no anonimato e desconhecido pela imprensa local e pela maioria da população, coube a três jovens (o maranhense José Conduru Pacheco, o paraense Luiz Paulino e o amazonense U.V.), a primazia de o incentivar, divulgar e fundar os primeiros clubes futebolísticos do Amazonas.
Ainda em 1907 existiam dois clubes de futebol em Manaus, o RACING e o SPORT CLUB DE MANÁOS, que deram origem à primeira e tímida rivalidade do futebol Baré realizando seus jogos na Praça Floriano Peixoto, no bairro da Cachoeirinha. Sendo assim, agora os fãs de esporte se dirigiam nos bondes até a Cachoerinha para acompanhar aqueles jogadores das duas equipes darem chutes e cabeçadas na esfera de couro, em busca do gol e da vitória. Mas a modalidade ainda sofria um certo preconceito de setores da sociedade manauara.
Contudo em pouco tempo o esporte bretão se tornaria a principal modalidade esportiva do Amazonas, culminando com sua consolidação definitiva e aceitação em 1909 quando surgiram nesse ano em Manaus 18 clubes para sua prática. Um outro torcedor escreveu para um jornal em 1918 que, com a morte do ciclismo anos atrás, o futebol se instalava definitivamente em Manaus acordando esquecidos ardores na alma dos esportistas.
Afirmava que agora para qualquer lugar que se fosse na capital amazonense, uma pessoa ouvia o mesmo assunto nas conversas: o chute do Craveiro, as escapadas do Paulo Mello e as cabeçadas do Sazão (que eram jogadores de destaque do Nacional e Rio Negro). Também ele dizia que em todas as praças da cidade e nas vias públicas havia sempre, dia e noite, grupos de crianças e rapazes jogando com velhas bolas remendadas, com caroços de tucumãs, bolas de tênis ou de meia. O atento correspondente finalizava o comentário dizendo que crianças, rapazes e velhos, de todas as profissões, falavam em futebol, pensavam em futebol e praticavam o esporte.
O próprio Dr. Astrolábio Passos (reitor da Universidade Livre de Manáos) contou que às 5 horas da manhã, tendo recebido um chamado urgente, notou que na sua frente um padeiro, com a cesta de pães às costas, cambaleava como se estivesse bêbado naquela hora do dia ainda escuro. Aproximando-se verificou que o padeiro, no seu zig-zag, chutava criteriosamente um caroço de tucumã (isso mostra a já grande aceitação do futebol pelas classes populares da cidade). Com a vinda da SELEÇÃO PARAENSE para jogar em Manaus, em maio de 1918, consolidou-se de vez o entusiasmo que a sociedade amazonense, de todas as classes sociais, tinha pelo esporte inglês, gerando uma verdadeira euforia, fanatismo e paixão na cidade durante os jogos dos visitantes com as equipes locais, onde formou-se uma grande torcida manauara, apelidada carinhosamente por eles de "tartarugas", contra a torcida adversária batizada de "paraenses".
CICLISMO RESSURGIA
E quanto ao ciclismo? bom, ele continuou sendo praticado no Estado, mas
sem a força de antes comparando com os anos de sua glória, porém aos poucos
voltaria a ficar em evidência com o surgimento de novos nomes que brigavam pelo
título de campeão. Em 1909 se fundou o "Velo Club" para gerir e
organizar os campeonatos, e em 1911 as disputas se davam em um outro Velódromo
chamado "Monte Cristo". Depois a modalidade passou a ser disputada no
estádio Parque Amazonense.
Anos mais tarde o antigo campeão Deodoro Freire (o Stoessel) ainda chegou a inaugurar um novo Velódromo, na década de 1940, na Cachoeirinha.
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Fontes: Jornal do Commercio, O Imparcial, O Tiro e o Sport.
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