CONTOS DA AMAZÔNIA ANTIGA - O VIAJANTE BAIANO, SEU MATEIRO E O... CURUPIRA?

Corria o distante ano de 1906 e se encontrava de viagem ao Estado do Amazonas o senhor Desgartes de Magalhães, natural da Bahia, que agora se dirigia para o Norte amazonense, na região do Rio Branco, local que hoje consiste no Estado de Roraima mas que naquela época pertencia ao Amazonas.

Desgartes resolveu seguir caminho por terra até ao seu destino final, a Vila de Boa Vista. E,para ali chegar, ele precisava de um experimente mateiro como guia e que fosse  conhecedor da região. Foi então que ele contratou um robusto e jovem caboclo chamado Osório. Eles então seguiram caminho por campo aberto até conseguir chegar em Boa Vista.

Depois de andarem por uma hora pelo campo, chegaram eles na orla da mata bruta, onde o mateiro disse a seu patrão que a melhor maneira de alcançar a Vila era atravessar aquela floresta.

Eles então penetraram na mata que, à medida que eles caminhavam, cada vez ia se fechando mais. Porém o tempo começou a escurecer com a chegada da noite e, pra piorar, nuvens carregadas começavam a se formar anunciando um grande temporal que não ia tardar a cair.

Mesmo assim, os dois homens seguiram caminho entre árvores gigantes e cipós entrelaçados, com o experiente Osório, calado e tímido, sempre à frente e abrindo caminho

Desgartes, então, perguntou ao seu guia: -"Osório, ainda está longe a vila?"

E eis que o caboclo respondeu: "- Não, está logo ali", e apontou para adiante.

Mas o "ali" que ele disse era interminável pois nada se via de presença humana ou de alguma residência à distância que podia pronunciar ser da Vila. Só se via na verdade o mato cada vez mais denso.

Eles já tinham andado cerca de um quilômetro, quando a escuridão já tomava conta por completo da floresta com as aves pousando e se agitando nas folhagens e galhos das árvores para seu sossego noturno. 

Desgartes, já com medo, começava a temer que talvez não teriam saída por terem perdido o caminho e mencionava que, pouco a pouco, parecia que penetraram no "reino lúgubre das sombras".

Mesmo assim eles continuavam avançando até que, num determinado momento, Osório percebeu algo e parou. Pôs então a escutar algum movimento estranho na mata e depois virou assustado para seu empregador que disse: -"O que há Osório?"

Ele então respondeu:"-Psiu!" e pôs o dedo nos lábios ficando olhando receoso para os lados, com um semblante misterioso que assustou Desgartes, que ficou se perguntando o que diabo seria para deixar aquele experiente guia tão assustado.

O viajante baiano não tinha notado nada de anormal, mas o caboclo decidiu verificar melhor e deu alguns passos à frente, penetrando com seu facão sozinho na mata um pouco adiante, deixando seu acompanhante a lhe esperar. Logo ele voltou para onde estava, pela ponta dos pés, e cauteloso disse para Desgartes: "- Patrão, acho bom voltarmos". 




Desgartes então já ia lhe perguntar qual o motivo de ele tomar essa decisão quando, subitamente, ouviu-se, já chegando perto deles, uma gritaria medonha de várias vozes ao mesmo tempo.

Os dois homens, assustados com aquilo, ficaram imóveis pois os gritos surgiram do nada e eram horríveis. Mas Desgartes engatilhou sua espingarda que trazia e se preparou para rechaçar o que saísse da mata cujos gritos vinham ao rumo deles.

Osório, trêmulo gritou: -"patrão, vamos voltar".

E sem esperar por mais nada, Osório puxou seu chefe pela manga do paletó, fazendo acompanhá-lo numa carreira louca pela floresta, tendo eles se embaralhado nos cipós, tropeçando e caindo e dando de encontro com as árvores, correndo cada vez mais eles na escuridão da floresta.

Até que, movidos pelo cansaço, resolveram parar em um determinado ponto, quando Desgartes disse:-"E agora Osório, para onde vamos?", e o caboclo então respondeu:"-Vamos para a casa do tio Pedro"

E seguindo pela mata por um outro caminho chegaram eles então, quando de longe viram o brilhar de uma luz, à casa do chamado tio Pedro.

De longe eles também ouviram o som de uma sanfona vindo da residência, quando enfim chegaram em frente à casa e pararam.

Desgartes aproveitou e perguntou a Osório o que ele pressentiu ou viu na floresta e de quem eram aqueles gritos ensurdecedores que vinham de dentro da mata virgem, e que fez eles correrem como nunca.

Para Desgartes poderiam ser os famosos índios Jauaperys, que naquele momento estavam em guerra com o homem branco.

Ele perguntou ao guia o seguinte: -"Me diga Osório o que foi aquilo afinal, eram os Jauaperys?".

O mateiro então respondeu: "- Não patrão, Jauaperys não andam naquela área, aqueles gritos eram de Curupiras ".

Desgartes ficou surpreso, logo ele que era um cético e que nunca acreditou em Curupira, Iara e nem em outros seres sobrenaturais que afirmava que não passavam de superstições criadas pelos índios e caboclos.

Nesse momento aparecia o dono da residência, seu Pedro, ainda com sua sanfona na mão. Desgartes então passou a conversar com o homem e contou o que tinha acabado de acontecer com eles cujo o morador ouvinte, também incrédulo, não acreditou que pudesse ser Curupiras e afirmava que poderia ser um velho chamado João Areré que era feiticeiro e ficava naquelas matas fazendo visagens.

Porém Osório, conhecedor dos mistérios da mata, continuava acreditando que era sim Curupira, um ser lendário que castigava todos aqueles que penetrassem em seus domínios ou maltratasse a floresta.

Lenda ou realidade? Acredite se quiser.

Fonte: Jornal "Pacotilha ".

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