LENDAS DA AMAZÔNIA - UM CASO MISTERIOSO DE CARNIFICINA NA PROVÍNCIA DO AMAZONAS
Em tempos longínquos, quando o
Estado do Amazonas ainda tinha o título de província e era uma das unidades
administrativas do império brasileiro, um grupo de 8 homens resolveu se
aventurar pelo vale amazônico e o explorar.
Os destemidos desbravadores
penetraram cada vez mais pelo interior da província, até que encontraram um
certo rio que corria por remotos terrenos. Na foz desse rio, havia um pequeno
povoado habitado pelos ditos civilizados.
Uma antiga moradia no interior do Amazonas,do mesmo estilo que é contato na lenda onde servia de residência dos trabalhadores. |
Os valentes homens passaram então a navegar pelo rio, penetrando cada vez mais por suas águas e se afastando do povoado. Até que chegaram em um determinado local que acharam ideal para ali morar e explorar a terra. Eles então atracaram sua canoa na margem, descarregaram seus utensílios pessoais e ergueram uma humilde e grande casa, feita de madeira de paxiúba e coberta de palha onde ali armazenaram suas ferramentas de trabalho essenciais para o cultivo do solo daquela região.
Como eles já eram homens
habituados à vida na floresta, não estranharam a solidão do local em que
estavam agora residindo, que ficava muito longe dos últimos locais da província
amazonense habitados pelos colonos e súditos do império.
Estando os rapazes praticamente
ali isolados, passaram eles a plantar e cuidar da terra, assim como extrair os
produtos da mata como castanha e borracha. Viviam da caça, da pesca e do quê
plantavam.
Certo dia, logo ao raiar do sol,
os homens se dirigiram para seu trabalho habitual, porém um deles acabou
ficando na casa pois estava doente e sem condições de trabalhar.
Estando ele ali sozinho, foi pela
manhã que o rapaz viu sair de dentro da floresta um velho indígena de aspecto
inofensivo que logo se dirigiu à barraca e ao homem. O indígena lhe disse, numa
mistura de português com nheengatu, que estava cansado de viver entre os índios
das várias tribos que habitavam aquele vasto território e que resolveu,
definitivamente, a terminar os seus já avançados dias de vida entre os brancos
que viviam no povoado mais próximo.
À medida que o ancião ia se
explicando, ele disfarçadamente lançava nas sete redes armadas dos companheiros
do rapaz as cascas de um pequeno fruto silvestre, o homem percebeu aquela
atitude e achou estranho mas nada comentou com sua visita. Pouco tempo depois,
o misterioso indígena retirou-se, deixando o rapaz meio desconfiado com o seu
inesperado aparecimento naquele local tão isolado e afastado.
Ao cair da tarde os 7 homens chegaram de seus trabalhos e foi aí que seu companheiro narrou a eles o que havia acontecido e a visita que teve, afirmando que havia algo de suspeito e misterioso no velho índio. Porém, cansados ao extremo devido ao pesado trabalho do dia, eles não deram à mínima atenção para o relato que julgaram sem importância. Foram então todos jantar, pois a noite havia chegado e a casa estava iluminada por velas e lamparinas. Após a janta, todos então se dirigiram para suas redes e caíram imediatamente num sono profundo. Mas o rapaz que os havia alertado, ainda desconfiado, resolveu armar a rede em outro ponto da casa, no local mais alto.
A noite estava lúgubre e, pela
floresta sem fim, uma forte ventania fazia balançar a copa das árvores. Na
cobertura de palha da casa, um pássaro chamado Cauã pousava e soltava seu grito
estridente, como se anunciando algo de ruim a acontecer.
De repente, o rapaz ouviu vindo
do interior da floresta um ruído confuso e prolongado, que o deixou
amedrontado. Parecia uma gargalhada infernal que ecoava pelos ares.
Então, subitamente, o homem viu apavorado a casa ser invadida por um grande número de animais semelhantes a cachorros, mas de aspectos sombrios e extremamente ferozes com dentes grandes e afiados e olhos cintilantes que brilhavam no escuro. E, surpreso e assustado, o rapaz também viu que as estranhas feras estavam acompanhadas do mesmo velho indígena que o visitara naquela manhã. Os ferozes animais logo se dirigiram para as redes dos 7 homens que despertaram de súbito de seu sono, mas sem tempo para reagir ao ataque fulminante. Os animais enfiavam seus possantes dentes nos pescoços dos infelizes que gritavam desesperados por socorro, matando-os instantaneamente e os estraçalhando.
Depois o que o rapaz observou o
deixou petrificado, pois as feras disputavam e devoravam a carne de seus amigos
com terríveis dentadas, sobre as paxiúbas ensanguentadas da humilde barraca.
Enquanto isso o misterioso indígena, dando a falta do rapaz com quem
tinha conversado pela manhã, o procurava por toda a casa sem o encontrar, pois
por sorte o homem tinha armado sua rede num ponto alto da casa, longe do olhar
do terrível visitante que, com pouca luz na parte em que ele estava escondido,
não conseguiu localizá-lo.
Ao fim da carnificina e do
banquete de carne humana, o bando das ferozes criaturas se retirou para o
escuro da floresta, sempre dirigidas e acariciadas pelo indígena que também
sumiu com os animais na mata.
Sobrou somente o rapaz, única
testemunha e sobrevivente do bárbaro fato que acabara de presenciar.
Quando o dia clareou é que ele
pôde realmente ver, horrorizado, o resultado da noite sombria que teve e que
jamais iria esquecer: as paredes de paxiúba estavam manchadas de muito sangue
assim como no assoalho, onde só restavam corpos dilacerados e restos de seus
infelizes companheiros de barraca.
Então, com os olhos em lágrimas,
saiu para o terreiro da casa e lá teve a triste missão de sepultar os restos
mortais de seus amigos à sombra de uma enorme árvore.
Depois de terminada a sua
melancólica tarefa ele foi para a barraca, pegou suas roupas e alguns objetos
pessoais e se dirigiu ao porto da casa onde embarcou em sua canoa com destino
ao povoado, situado na foz daquele rio, que ficava há dias de viagem à remo.
Ao chegar no povoado e contar a todos o acontecido, os habitantes do lugar ficaram espantados e ninguém se prontificou a voltar ao local do ocorrido para descobrir quem era o misterioso indígena e o fazer pagar pelos assassinatos. Porém para muitos se tratavam de espíritos demoníacos da mata que não queriam aqueles trabalhadores ali, ou talvez seriam os temidos "Janaís".
O rapaz, único sobrevivente da
tragédia, impressionado com o que viu e com o violento fim de seus
companheiros, enlouqueceu e acabou seus dias de vida no dito povoado.
Que personagem então seria aquele
que os atacou junto com as feras? Seria os "Janaís"? Ou seria o
"Curupira"? Acredite se quiser.
Fonte: jornal "Folha do
Acre".
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