NO AMAZONAS, BANDO DE HERCULANO CRUZ INVADE E SAQUEIA A VILA DE CANUTAMA
Quando a exportação da borracha e a sua consequente queda do preço entrou em crise no estado do Amazonas, os locais que dependiam da produção do produto entraram em profunda decadência. E, devido a isso, a pobreza aumentou mais ainda com a fome se alastrando por vários pontos do estado fazendo surgir no interior do Amazonas alguns grupos insurgentes que, bem organizados, armados e direcionados por líderes, invadiam os seringais, comunidades e vilas, saqueando as casas comerciais, agredindo os moradores e enfrentando a polícia, resultando em mortes.
O ápice dessa crise econômica e
conflitos aconteceu no ano de 1921 quando estouraram várias ocorrências no interior,
umas devido ao desespero da população em busca de gêneros alimentícios e outras
devido a enfrentamentos violentos nas regiões do Baixo Amazonas, rio Madeira e
Rio Purus, com ação de bandos armados que desafiavam as autoridades constituídas,
espalhando o terror nas zonas em que atuavam.
Um desses bandos surgiu na área
do rio Purus, e era chefiado por um indivíduo chamado Herculano Cruz que passou
a realizar ali suas ações armadas, ficando ele e seus seguidores famosos e
temidos naquela região. Uma primeira notícia sobre as atividades do grupo
aconteceu quando eles atacaram a localidade de Jadibaru, sendo que dali eles
seguiram para pilhar a sede do município, ou seja, a Vila de Canutama.
No dia 14 de março de 1921, os
insurgentes, escondidos na mata, chegavam próximo à Vila e por volta das 22
horas Canutama (na margem do rio Purus) era atacada de surpresa por 30 homens
do bando estando à frente o famigerado chefe Herculano Cruz.
Armados de espingardas, cacetes e
terçados, os rebeldes depredaram quase toda a Vila, agredindo as pessoas e
ferindo outras, causando pânico nos moradores que corriam desesperados para
salvarem suas vidas. Pegos de surpresa, o pequeno número de policiais não teve
como rechaça-los. Os invasores saquearam por completo a casa comercial dos
irmãos judeus Jacó, Isaac e Jaime Cohen, como também outra pertencente ao
comerciante Jaime Chacron.
O início da pilhagem aconteceu
quando o comerciante Elias Cohen estava dormindo e foi despertado com batidas
na porta do seu estabelecimento. Embora já estivesse deitado ele resolveu abrir
a porta e, sem saber de nada, viu que eram dois homens que lhe disseram que
queriam comprar remédios. Elias foi ao interior da casa trazer as pílulas e
quando voltou viu mais dois outros sujeitos chamados Henrique Chumano e Manoel
Domingos armados de cacetes que logo lhe renderam, sem tempo da vítima esboçar
qualquer reação. Na sequência Herculano e seus demais homens cercaram o
comércio e começaram a pilhagem.
Depois eles se dirigiram para o
comércio de Jaime Cohen, usando da mesma estratégia onde um outro membro do
grupo chamado Idelfonso ali entrou pedindo remédio e logo rendeu o comerciante.
Após o ataque, o grupo assaltante
fugiu com as mercadorias para o lago Sabaiará (que ficava distante uma hora de
viagem de Canutama), que era o lugar de seu quartel-general e esconderijo. Durante
o caminho em fuga os rebeldes aproveitaram e invadiram também a propriedade
agrícola de Jaime Cohen onde cometeram atos violentos, chegando eles a ameaçar
as mulheres que ali residiam.
Logo que soube do ocorrido o
coronel Teodoro Botinelly, influente personagem do lugar, tratou de auxiliar as
vítimas do ataque, abrigando em sua casa aquelas que fugiam, no lugar Aliança, e
providenciando o transporte das mercadorias que não haviam sido levadas pelos
insurgentes, levando-as para um local seguro em sua propriedade.
Apavorados, autoridades, comerciantes
e população em geral fugiam de Canutama, pedindo providências enérgicas, em
Manaus, do governador César do Rego Monteiro pois que os chamados bandoleiros
ameaçavam invadir a Vila novamente e já dominavam uma vasta região do
município.
Na foto de cima, do início do século XX, se tem a Vila de Canutama (que hoje é uma cidade), na mesma época da invasão que teve. E na ilustração de baixo se tem uma imagem de como eram os membros do bando de Herculano Cruz, baseado nas informações da época, quando invadiram e dominaram a Vila. |
A REAÇÃO DAS AUTORIDADES E
PRISÃO DE ALGUNS MEMBROS DO BANDO
Dias depois da invasão de
Canutama, as vítimas dos saques se dirigiram até a presença do senhor Francisco
Chagas Araújo, que era o primeiro suplente de juiz, pedindo providências do
mesmo contra o bando de Herculano.
Em resposta foi organizado um
contingente policial do município que saiu da Vila em diligências à procura dos
rebeldes na zona rural, conseguindo os policiais localizar e prender o líder
Herculano Cruz e também seus subordinados Luiz Capitão, Henrique Chumano, Sebastião
Guariba e Manoel Domingos, sendo eles levados à presença das autoridades
municipais.
Muito auxiliou nessas prisões o
mencionado coronel Botinelly devido aos ofícios que ele encaminhou às
autoridades como também nas diligências policiais que tinha participado, na
perseguição ao bando.
Porém a maioria dos revoltosos
não haviam sido presos e continuavam escondidos no lago Sabaiará e em outros
pontos próximos, organizando eles outras investidas violentas que poderiam ter
êxito pois o delegado de Canutama não tinha força policial suficiente para
prendê-los ou enfrentá-los, uma vez que o reduzido número de policiais estava
agora guarnecendo a Vila de um possível novo ataque.
Um fato curioso é que, segundo
uma notícia da imprensa, as esposas dos membros do bando, que residiam no dito
lago Sabaiará, faziam promessas a São Benedito de celebrar ladainha e outras
honrarias ao santo caso seus maridos não fossem apanhados e nem sofressem
qualquer tipo de violência.
CHEGADA DOS COMERCIANTES DE
CANUTAMA À MANAUS
Temerosos de um novo ataque do
bando, os comerciantes Júlio Martins e Francisco Evangelista, proprietários das
únicas casas comerciais que ainda mantinham as portas abertas após a invasão de
Canutama, partiam de um navio a vapor com rumo à capital, Manaus. Também fugiam
de Canutama as famílias do Dr. Antônio Anunciação (juiz de Direito) e do
delegado de Polícia Afonso Galvão.
Somente no dia 18 de março que a
notícia da invasão de Canutama chegou à Manaus, através de um radiograma vindo
de Lábrea, tomando então o governador do Amazonas conhecimento do grave fato.
No dia 25 de março chegavam do
Purus à Manaus, no vapor "Sapucaia", os comerciantes Elias Cohen e
Isaac Cohen (sócios da mesma firma) que eram naturais do Marrocos e que vieram
pedir providências do cônsul de seu país sobre a pilhagem e agressões que
sofreram, além de relatarem para a imprensa local todos os pormenores do
ocorrido em Canutama naquela noite violenta.
Não se sabe o que aconteceu com o
chefe do bando, Herculano Cruz e seus comandados pois as notícias na imprensa
sobre eles cessaram Contudo, é possível que a polícia tenha perseguido e
desmantelado o bando, pondo fim às suas ações violentas na zona do Purus.
Fontes: Jornal do Commercio, Gazeta
da Tarde.
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