O CASTIGO DOS PARINTINTINS: SERINGUEIRO PAGA SUA AUDÁCIA COM A VIDA

Durante o apogeu do período da borracha (no início do século XX), a região do rio Madeira,no Estado do Amazonas, se tornou uma das principais zonas produtoras de borracha no Brasil. Devido a isso várias firmas comerciais  ali se instalaram, trazendo seus trabalhadores para o corte da seringa.

Porém aquela área era habitada por diversas etnias indígenas, das quais várias eram contra a presença do homem branco em seu território. Dentre elas estavam os Araras, Nhambiquaras e Parintintins, hostis aos seringueiros e travando com eles, nesse período, uma verdadeira guerra com muitas mortes de lado a lado.

O seringalista espanhol Carlos Miguel Asensi (que chegou ao Amazonas em 1895) era o maior proprietário de seringais na zona do rio Madeira, sendo o mais importante deles chamado de Calama. Era comum os indígenas atacarem os seringais de Asensi e matar seus trabalhadores, assim como os seringueiros do espanhol também invadiam aldeias e matavam índios.

Entre os nativos daquele espaço, e de índole guerreira, os Parintintins eram os mais temidos pois eles consideravam os seringueiros e seus patrões como inimigos mortais. O conflito entre os dois grupos seguiu sem tréguas até a pacificação dos Parintintins, em 1922.


Na ilustração do século XIX, se vê um encontro pacífico de indígenas com seringueiros e exploradores no rio Madeira.


SURGE UM CONTROVERTIDO PERSONAGEM

Em 1918 existia o seringal Santa Rita dos Marmelos, que ficava na margem do rio Marmelos que é um afluente do rio Madeira. E naquele ano vivia ali o maranhense Guilherme Ferreira que, como tantos outros nordestinos, viera do Maranhão para o Amazonas em busca de uma vida melhor, passando a trabalhar na extração do látex.

De tanto se embrenhar na mata para fazer seu árduo serviço do dia a dia, acabou dando de encontro com os Parintintins, mas ao contrário do que podia acontecer, o nordestino acabou fazendo amizade com os índios, que no início o viam com desconfiança, afinal, ele era um seringueiro.

Mas o trabalhador acabou ganhando a confiança dos indígenas e foi com eles conhecer suas malocas. Não demorou muito para, aos poucos, ele ir ganhando a simpatia de toda a tribo, inclusive do cacique. Devido a isso, Guilherme agora poucas vezes vinha à Santa Rita, preferindo ele passar os dias na aldeia, onde gozava de plena confiança de todos e era bem tratado.

Aproveitando a ocasião, o hóspede da aldeia tratou de tirar proveito daquela amizade e daí passou, de vez em quando, a instigar os Parintintins a atacarem diversos seringais do rio Madeira, pois Guilherme conhecia bem a localização deles, os melhores horários pra atacar e quantas pessoas mais ou menos haviam ali. Os índios, com as preciosas informações e decididos a expulsar os seringueiros dali, levaram em consideração as palavras do maranhense e passaram a atacar os seringais por ele apontados, o que resultava em ataques surpresas, barracões incendiados e muitas mortes dos dois lados, mas que na maioria das vezes os índios conseguiam destruir por completo os locais.

Ninguém, porém, imaginava que aqueles ataques fossem induzidos por Guilherme. E quando ele aparecia nas pequenas povoações e seringais, ficava alarmado quando lhe contavam dos últimos ataques dos Parintintins, ou seja, não mostrava para as pessoas nenhuma desconfiança.

Mas, com o tempo, o seringueiro maranhense começou a abusar da amizade com os índios e aí começou a ditar regras para eles e exigir várias coisas, o que começou a desagradar o cacique e outros índios. Mas a gota d'água foi quando Guilherme violentou uma menor da tribo.

Os indígenas, tendo conhecimento do fato, procuraram por Guilherme, mas este, já temendo a fúria dos Parintintins quando assim soubessem do ocorrido, tratou de fugir rumo à Santa Rita dos Marmelos, onde chegou no dia 18 de fevereiro.


A INVASÃO E A SENTENÇA FINAL

Guilherme pensou que ali em Santa Rita estaria seguro. Grande engano pois os Parintintins, determinados a se vingar da afronta dele e cheios de ódio, resolveram lhe fazer uma surpresa. No dia seguinte, 19 de fevereiro, ao cair da noite, os índios invadiram o seringal, mas não pra guerrear com os trabalhadores do local, e sim somente para sequestrar o seu antigo aliado. Eles então se dirigiram à barraca onde estava Guilherme e o surpreenderam quando ele estava deitado, carregando-o com destino à mata na escuridão da noite.

Com o seu prisioneiro imobilizado, e já distantes do local do sequestro, os índios resolveram parar em um determinado ponto e amarraram sua vítima ao tronco de uma árvore, dando ali mesmo a sua sentença de morte e executando-a imediatamente.

Ao amanhecer o dia, os moradores e trabalhadores de Santa Rita que pressentiram o que havia acontecido na noite anterior, deram logo falta de Guilherme, e imaginaram o que podia ter acontecido. Eles então armaram-se com suas espingardas e, seguindo as pegadas dos índios, se embrenharam na floresta com a finalidade de resgatar com vida o seu companheiro. 

Penetrando eles cada vez mais na mata virgem, à certa altura o grupo parou perante uma seringueira e, trêmulos, viram que o corpo de Guilherme Ferreira estava ali na árvore amarrado por grossas cordas e sem vida. Seu corpo estava inchado e com várias escoriações, devido às muitas pancadas que levou, e aos seus pés havia uma grande poça de sangue.

Aproximando-se mais, viram que o cadáver fora profanado, faltando-lhe a língua e tendo os dois olhos furados.

Aterrorizados com a horrível cena, resolveram voltar o mais rápido possível, pois perceberam alguns vultos dos índios entre as árvores, que os olhavam escondidos e, de súbito, desapareceram na mata adentro.

 

Fontes: Jornal do Commercio, O Tempo.

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