UM ANTIGO CRIME ENTRE ALEMÃES NO AMAZONAS

Com o advento do ciclo da borracha no Norte do Brasil, milhares de imigrantes chegaram à Amazônia para usufruir desse período de fausto atraídos pela grande circulação de capital em toda a região, o que proporcionava esperança de muito ganho para os nativos e para muitos que se aventuravam, indos de outras regiões do país e do exterior.

O Estado do Amazonas recebeu muitos imigrantes estrangeiros nesse período, cuja maioria se fixou na capital Manaus, formando suas prósperas colônias e se dedicado à vários ramos de trabalho. Entre os principais estavam portugueses, espanhóis, italianos, ingleses e alemães.

Os alemães no Amazonas formaram uma colônia muito atuante no comércio local, sendo que as duas principais firmas exportadoras de borracha no Estado eram de origem germânica.

Embora, como se disse, a grande maioria dos alemães do Amazonas fixaram residência em Manaus, alguns deles resolveram penetrar pelo interior amazonense e tentar obter ganhos. Foi o caso dos protagonistas de um triste fato violento que aconteceu nas paragens interioranas do Solimões, e que se tornou um dos mais conhecidos crimes envolvendo membros da colônia germânica do Amazonas, sendo notícia nos principais jornais do estado.

 

AMIGOS ALEMÃES DECIDEM IR PARA O INTERIOR

Em 1910, motivados pelas notícias de muito dinheiro que poderiam ganhar no Norte do Brasil, os amigos alemães Wolfgang Sodemann e Heinrich Geisler resolveram vir tentar a sorte no Amazonas, sendo que Geisler trouxe sua esposa. E assim os três aventureiros deixaram sua pátria, a Alemanha, e seguiram rumo à Manaus atravessando o oceano Atlântico de navio.

Os três chegaram à capital amazonense em 1910 e, atraídos por um parente de Wolfgang Sodemann que morava no interior, os três germânicos resolveram então deixar Manaus e se dirigiram num navio a vapor para o Alto Solimões. Chegando ao local os alemães se fixaram numa casa na margem do rio Solimões, próximo à vila de São Paulo de Olivença, onde passaram a morar. E ali eles começaram a trabalhar de regatão, um mascate fluvial, onde vendiam em suas canoas os seus produtos aos caboclos trabalhadores em troca de borracha e cacau. E assim os três amigos viveram na tranquilidade durante seis anos.

Porém a dor da solidão afetiva cada vez mais afetava a Wolfgang que começou a olhar com outra intenção para a esposa do amigo, que cada vez lhe chamava mais a atenção.

 

TRAIÇÃO E ÓDIO

Em um determinado dia em que Heinrich não se encontrava na casa, Wolfgang sussurrou no ouvido da mulher a sua real intenção, ou seja, que ela fugisse com ele na canoa para outro local mais distante onde, conduzidos pela força da correnteza do rio, com certeza chegariam em outro lugar onde o destino lhes reservava melhores momentos.

Porém a alemã, mostrando resistência e fidelidade a seu esposo, não aceitou o convite. Mas Wolfgang voltou a cortejá-la e ela, esquecendo o que tinha dito, acabou dessa vez aceitando a proposta. Na sequência os dois embarcaram numa canoa e desapareceram, deixando a casa abandonada.

Nessa ocasião Heinrich estava trabalhando e, quando voltou à casa, é que enfim percebeu o que havia acontecido, ficando ele furioso pela dupla traição e punhalada que acabara de receber: daquele que julgava seu grande amigo e daquela que era sua esposa.

Contudo o ódio subiu mais a cabeça de Heinrich que resolveu não deixar aquilo barato e lavar sua honra, preparando sua vingança contra aquele que feriu sua confiança e orgulho. Ele pegou sua espingarda e embarcou em sua canoa, indo atrás do seu antigo amigo que com certeza apareceria no local que ele imaginava. 


 


DECIDIDO A SE VINGAR DA TRAIÇÃO, REGATÃO ALEMÃO DISCUTE COM SEU CONTERRÂNEO CULMINANDO COM A MORTE DO RIVAL

Então, no dia 8 de maio de 1916, Wolfgang estava na localidade de Santa Rita, indo do seu trabalho de regatão. Foi quando Heinrich, já de tocaia, foi ao encontro do seu agora rival. Enfim os dois se encontraram na margem do rio, com Heinrich logo perguntando a Wolfgang (que estava em sua canoa) qual o motivo de ter feito aquilo com ele, de trair sua confiança, além de lhe fazer várias outras perguntas. Wolfgang, ficou acuado e apenas respondia que as coisas não eram como ele pensava, tentando se defender das acusações daquele marido traído. Mas Heinrich não tinha a mínima intenção de o perdoar e, num momento de ira, pegou a sua espingarda que estava num recanto de sua canoa, mirou e abateu seu oponente com três tiros certeiros, caindo ele morto e enchendo a canoa do infeliz de sangue. Depois o assassino empurrou a canoa com o cadáver dentro, que ficou à deriva no rio Solimões sendo levada água abaixo pela correnteza.

Mas depois Heinrich acabou caindo num remorso profundo e resolveu se entregar às autoridades da Vila de São Paulo de Olivença, onde relatou todo o ocorrido.

A canoa com o corpo de Wolfgang, que tinha 30 anos de idade, foi encontrada horas depois do assassinato, sendo seu corpo retirado e enterrado na comunidade de São João, lugar que era propriedade de um tio seu.

Heinrich Geisler foi recolhido à cadeia de São Paulo de Olivença. Porém o juiz do município constatou que não havia segurança no presídio e, por isso, resolveu remeter o alemão para Manaus a bordo do navio a vapor "Índio do Brasil “, sendo o assassino escoltado por uma praça da polícia.

 

CRIMINOSO CHEGA À MANAUS E É RECOLHIDO À PENITENCIÁRIA

O "Índio do Brasil" chegou ao porto de Manaus no dia 25 de novembro de 1916.

E às mãos do chefe de Polícia, Dr. Freitas Bastos, chegou também o ofício contando o motivo da prisão do acusado, sendo que em seguida a autoridade pediu que o criminoso fosse recolhido à cadeia, ficando ele detido na chefatura de polícia da rua Marechal Deodoro, ficando ali à disposição do juiz de Direito da mencionada comarca.

O chefe de Polícia informou do caso para o cônsul da Alemanha no Amazonas, Hugo Ohliger, que há dias havia pedido informações do episódio.

Dias depois, em 18 de dezembro, o delegado de Polícia do primeiro distrito recolheu Heinrich Geisler, junto com outros presos, para a penitenciária de Paricatuba deixando ele o xadrez da rua Marechal Deodoro, onde aguardava transferência para aquela casa de detenção.

Na imagem se tem uma representação do que seria Heinrich Geisler, indo em sua canoa armado, disposto a dar um fim em seu conterrâneo.

 

FONTE: Jornal do Commercio.


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