UM INTITULADO VIDENTE QUE SURGIU EM MANAUS E QUE CAUSOU ALVOROÇO, FICANDO CONHECIDO NA CIDADE COMO O "MESSIAS DE SÃO RAIMUNDO"


Era o ano de 1920 e desembarcava em Manaus, indo do Acre, o seringueiro cearense Antônio Alves Sobral. Como muitos retirantes nordestinos daquela época, Sobral chegou à Amazônia para trabalhar na extração da borracha, com a finalidade de um dia voltar para sua terra com muito dinheiro no bolso.

Porém num determinado dia, o seringueiro deixou seu local de trabalho e embarcou em um navio, seguindo rumo à capital amazonense.

Logo que chegou à Manaus, se espalhou entre a população da cidade que o recém-chegado tinha poderes especiais pois se dizia que ele ouvia voz de espíritos que lhe transmitiam adivinhar o futuro das pessoas e curá-las de todo tipo de doença.

Sendo assim, o vidente afirmava que tinha toda solução para os problemas das pessoas com a notícia se espalhando pelos subúrbios e centro da cidade, locais onde começou a profetizar a ponto de ele ser seguido por um grande número de fiéis gerando uma verdadeira romaria, indo ele atender nas residências onde as portas e janelas das casas eram fechadas para evitar a invasão de grande número de pessoas que queriam com ele ter uma consulta e ouvir seus conselhos.

Um bom exemplo disso aconteceu no dia 17 de fevereiro de 1920.Durante a manhã daquele dia, uma grande massa de populares, entre os quais idosos e inválidos, alguns andando com dificuldades e outros de muletas, se aglomeravam em frente e nas imediações do Hotel Universal, na rua Teodoreto Souto, num grande murmúrio de vozes de todas as idades. O motivo daquela grande procissão é que se encontrava hospedado no referido Hotel o já mencionado vidente Antônio Sobral, que ali estava dando suas consultas espirituais.

Todos queriam ouvi-lo e vários procuravam à força invadir o Hotel para ter a oportunidade de falar com Sobral. Estabeleceu-se então um grande tumulto e confusão que logo forçou o proprietário do estabelecimento a fechar as suas portas.

Porém essa decisão fez agravar ainda mais a situação pois a atitude do dono irritou ainda mais a massa popular que, aos gritos de protesto, tentou botar abaixo as portas do edifício. Foi uma confusão total.

 

ANTONIO SOBRAL É INTIMADO A COMPARECER NA CHEFATURA DE POLÍCIA E RECEBE UM ULTIMATO

O chefe de polícia, Dr. Freitas Bastos, ao tomar conhecimento do caso que agitou aquela pacata manhã, mandou chamar à sua presença o pivô da confusão, o falado vidente que havia chegado do território acreano.

Antônio Sobral, entretanto, pediu à autoridade que aguardasse algumas horas, talvez receioso do episódio tumultuoso, só chegando à chefatura de polícia às 16 horas, no mesmo dia 17 de fevereiro.

Ali, depois de se identificar, Antônio Sobral penetrou no gabinete do chefe de polícia, onde se achavam também alguns magistrados, médicos, engenheiros e advogados.

O Dr. Hamílton Mourão lhe formulou algumas perguntas que logo foram respondidas por Sobral, mas que a autoridade concluiu que não passavam de respostas falsas concluindo ele que estava perante um charlatão. E o mesmo se sucedeu com o Dr. Galdino Ramos e outros presentes que também chegaram ao veredito de que aquele indivíduo estava mentindo, devido aos contrastes em suas afirmações.

Por não ter convencido nenhuma das autoridades na chefatura, o chefe de polícia resolveu dar um ultimato ao vidente, mandando Sobral voltar, o mais rápido possível, para o seringal do Acre do qual veio.

Com essa ordem, Antônio Sobral prometeu à autoridade policial que não só deixaria Manaus logo como não faria mais nenhuma consulta espiritual às pessoas que lhe procurassem.

Mas Sobral não cumpriu o que prometera pois continuou na cidade e fazendo suas revelações para o povo, o que levou a autoridade de polícia de tomar a decisão de expulsá-lo para bem longe de Manaus.

No dia 23 de fevereiro uma comissão de membros da colônia cearense do Amazonas veio à redação do jornal do Commercio pedir providências, a quem fosse de direito, contra a ordem do chefe de polícia que havia mandado prender e deportar Antônio Sobral pelo fato de ainda estar fazendo suas revelações. Acrescentaram os membros da comissão que em virtude dessa ordem que entenderam como uma coação contra a liberdade individual, Sobral se encontrava foragido.

Apesar dos protestos não tardou muito para a polícia o encontrar e o prender, mandando-o deportado, dentro de um navio a vapor, para Belém do Pará.

 

A VOLTA DE SOBRAL, AGORA RESIDINDO NO SUBÚRBIO DA CIDADE - POLÍCIA NOVAMENTE NO SEU ENCALÇO

Porém parece que Sobral não se deu muito bem na capital paraense onde passou alguns meses, e decidiu embarcar de volta em outro navio com destino à Manaus. Chegando novamente à cidade, Sobral fixou residência no bairro de São Raimundo, que ficava no subúrbio da cidade e era habitado, em sua maioria, por pessoas humildes.

Nesse bairro Sobral recomeçou suas atividades, se dizendo agora um novo Jesus Cristo, um messias enviado por Deus para curar e aconselhar a humanidade. Formou-se então grande romaria para sua casa onde ele falava a todos, aconselhava as pessoas e lhes passava receitas médicas para curar suas enfermidades. Ele então ficou conhecido como o "Messias de São Raimundo" sendo seguido, por onde passava por muita gente que queria ouvir suas profecias.

Todavia eis que a polícia soube da volta de Sobral e de suas costumeiras ações, e novamente os policiais saíram em sua caça, conseguindo achar ele, onde foi detido e remetido ao hospício Eduardo Ribeiro, na Avenida João Coelho, pois agora foi acusado de ser louco.

Mas pouco depois Sobral fugiu do hospício e desapareceu. Porém no dia 24 de junho a polícia recebeu uma carta de Sobral com má caligrafia, onde não se deu para entender quase nada, somente no final em que escreveu "Nossa Senhora nos cubra de fortuna".

Às nove horas da manhã do dia seguinte ele foi reencontrado pela polícia, sendo mais uma vez preso e internado no hospício.

Depois disso, não se sabe o que aconteceu ao famoso messias.

Para as autoridades ele não passava de um louco e agitador, mas para a população humilde ele era um alívio para seus problemas e aflições e para outros era um charlatão.

 

Fonte: Jornal do Commercio.

 




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