BARBARIDADE NA AMAZÔNIA EQUATORIANA
O fato aconteceu no longínquo ano
de 1917 e envolveu um casal de seringueiros do Ceará que foram vítimas de
crueldades, sendo o resultado de sua trajetória estampada na primeira página de
um jornal de Manaus que mencionou os "atrozes martírios" que passaram
e que resultou em torturas e morte que, como bem publicou o noticiário, foram
"horrores piores que os da santa inquisição".
Em 1914 chegava à Manaus um casal
de cearenses chamado Manoel Antônio de Castro e Madalena Lima de Castro. Como a
maioria dos nordestinos daquela época, eles migraram de sua terra para o
Amazonas em busca de uma vida melhor, visando trabalharem nos seringais da
região e um dia voltar ao Ceará com muito dinheiro.
De Manaus o casal foi para um
distante seringal no rio Içá onde ficaram trabalhando arduamente por dois anos.
Na ilustração, de Lucio Izel, se tem os capangas de Dom
Rômulo esquentando os dois espetos para introduzir na boca de seu prisioneiro. |
A CHEGADA NO EQUADOR E O
EMPREGO NUM SERINGAL.
Em 1916, procurando obter mais
vantagens e adquirir melhor trabalho e que pagasse mais, os dois seringueiros
resolveram deixar o seringal e navegaram subido o rio Içá, saindo do Brasil e
penetrando em território do Peru, onde ali o rio muda de nome e passa a se
chamar Putumayo. Continuaram navegando o rio Putumayo e chegaram até às suas
cabeceiras na República do Equador, onde conseguiram emprego nos seringais do
peruano Dom Rômulo Garcez.
O seringalista Dom Rômulo
empregava vários trabalhadores em suas propriedades, sendo a maioria de
equatorianos e peruanos e já era conhecido por maltratar seus seringueiros.
Poucos dias depois da chegada do
casal de brasileiros Dom Rômulo começou a perseguir Madalena, lhe dando
propostas para deixar seu marido e ficar com ele, mas era sempre repelido por
ela.
A RECUSA DE PROPOSTA INDECENTE
TERMINA EM FERIMENTO E AGRESSÃO
No dia 15 de maio de 1917, ainda
persistindo em seu objetivo, Dom Rômulo se dirigiu à barraca do casal cearense
e lá encontrou Madalena sozinha e, aproveitando a ocasião, voltou a lhe fazer
uma proposta indigna.
Madalena não atendeu o desejo de
seu patrão perseguidor que, furioso pela recusa, a agarrou à força. Desesperada
para se livrar dele, Madalena se apossou de um punhal e furou o homem no braço
esquerdo que, se vendo em dor, a soltou e se retirou ferido. O seringalista
voltou a seu barracão e ali decidiu castigar a mulher que se recusou a ficar
com ele e o feriu. Dom Rômulo Garcez então ordenou a dois capangas seus que
fossem à barraca do casal e trouxessem Madalena à força.
Manoel Antônio, o marido de Madalena,
ainda estava no serviço do corte da seringa, quando chegaram na barraca os dois
capangas e trouxeram a pobre mulher arrastada pelos cabelos para se apresentar
a seu patrão a quem havia ferido.
Chegando lá Madalena foi amarrada
num tronco sendo em seguida espancada pelo patrão.
A CHEGADA DO MARIDO:
FERIMENTOS, FUGA, TORTURA E MORTE
Chegava à noite e Manoel
regressava à sua barraca e ali não encontrou sua mulher. Pensou o pior e logo
se dirigiu ao barracão de Dom Rômulo onde ao chegar não teve tempo de proferir
uma palavra pois foi agarrado por 4 homens e em seguida amarrado num outro tronco,
próximo onde Madalena estava amarrada, que gritava loucamente.
Num esforço desesperado, Manoel
conseguiu partir as cordas que o prendiam ao tronco. Nessa ocasião surgiram
três homens para dominá-lo, recebendo um deles uma punhalada. Aproveitando a
confusão Manoel conseguiu se desvencilhar dos sujeitos e correu para o lugar
onde estava sua mulher Madalena e a soltou. Nesse momento apareceu Dom Rômulo
que recebeu de Manoel duas punhaladas no peito ficando ele gravemente ferido.
Manoel então ordenou à sua mulher que fugisse para a outra margem do rio.
Mas logo aparecem outros três
capangas de Dom Rômulo sendo que um deles foi também ferido por Manoel que na
sequência fugiu, seguindo o cearense o mesmo rumo que tomara sua esposa. Ao
chegar na beira de um igarapé e entrar numa canoa, Manoel foi atingido na perna
por um tiro de rifle disparado por um capanga que foi no seu encalço.
Ferido, Manoel foi agarrado por
seus perseguidores que o levaram e novamente o amarraram ao tronco onde ali
passou dias esperando pelo veredito final de seu patrão que estava ali em
tratamento dos ferimentos que teve.
Passados nove dias, Dom Rômulo se
recuperou das punhaladas que recebeu do seringueiro cearense e, furioso,
resolveu se vingar de seu agressor da pior maneira possível, dando como
sentença final a morte ao pobre homem que ali estava prisioneiro.
O seringalista ordenou a seus
capangas que fizessem uma fogueira e colocassem na mesma dois espetos de ferroa-te
ficarem em brasa. Feito o serviço, Dom Rômulo mandou introduzir os ferros
incandescentes na boca de Manoel, para queiram-lhe a garganta, o que foi feito.
Não satisfeito com isso, Dom
Rômulo ainda mandou despejar no esôfago do cearense água fervendo de uma lata
que foi introduzida à força para a vítima beber, indo então Manoel Castro a
falecer em meio a gritos e dores, enquanto seu inquisidor olhava a selvageria
sem a menor compaixão.
A MULHER CEARENSE CONSEGUE
CHEGAR AO BRASIL E REVELA TUDO ÀS AUTORIDADES
Madalena, a sobrevivente que
conseguiu fugir, assistiu a toda macabra cena escondida no mato, sem poder
fazer nada para ajudar seu marido. Em seguida ela conseguiu fugir dali,
caminhando por dias na floresta e se alimentando de frutas silvestres.
Ela conseguiu alcançar o rio Putumayo,
saindo do Equador passando pelo Peru, navegando e chegando no lado brasileiro.
Já estando no rio Içá, Madalena revelou tudo as autoridades do Estado do
Amazonas acrescentando que os criminosos não podiam ser punidos devido, naquele
lugar remoto da Amazônia Equatoriana, não existirem autoridades judiciárias e
nem policiais.
...
Fonte: Jornal do Commercio.
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